Hoje faço 60 anos. Pensar sobre a velhice é difícil. Não deveria. A gente quer viver muito, mas não quer ficar velho. A obviedade é enterrada e parece ser possível um outro caminho. Não há, e enquanto estivermos vivos, o melhor é conviver bem com o envelhecimento.
É engraçado, mas só agora penso nas incertezas do que virá, como se antes pudesse me assegurar que todo o planejado fosse realmente acontecer. A verdade é que envelhecer traz dúvidas e medos sobre o futuro. Mas certamente, não é sinônimo de se entrevar. Não é sobre realizar exercícios físicos e se alimentar bem, isso é bom pra todos os bichos, em qualquer idade.
Entendo que nos preparamos para o envelhecimento, quando prestamos mais atenção a nós mesmos. Quando deixamos que nossos filhos assumam suas responsabilidades, abandonamos controles fictícios, e principalmente continuamos produzindo e pensando. Não precisamos entregar nosso destino pra ninguém.
Apressar a decrepitude é mais do que comum entre as mulheres, as quais desistem de si, de fazer planos. É muito triste. Recolhem-se, certas que perderam toda a potência de existir. Os rótulos estão aí para serem derrubados. Minha mãe só se entregou quando viu que não dava mais. Gostava de comandar sua vida, de realizar suas escolhas. Lembro o quanto ela resistiu em parar de dirigir, lutava pela sua autonomia. E como seu exemplo me fortalece. Não abrirei mão do que quero.
Usei meu inferno astral para fazer alguns balanços. Resolvi me absolver das agruras em que me meti, sem penitências. Um bom começo é pensar em usar nossa experiência em vez de viver reclamando das perdas inevitáveis.
O viver para mim, só vale sem medo. Gosto de desafios, de continuar aprendendo. Quero rugas leves que mostrem diariamente minha história. Preciso da alegria das conversas, da embriaguez do vinho, do prazer de encher os olhos d’água com o beleza, de admirar o sublime.
Quero estar perto dos que amo, mudar, estudar sobre as pragas da nossa sociedade como o racismo, a homofobia, a misoginia, o machismo. Prestar atenção no mundo, lutar ao lado dos que querem melhorá-lo, torná-lo mais justo. Quero ler livros, ouvir músicas, ir ao cinema, teatro, cercar-me de arte, tão necessária e desprezada em nosso país.
Hoje não posso fazer uma grande celebração. A festa será um bolo em casa com poucos. E esse texto, que demorei a escrevê-lo, pois precisava dele o mais real possível. Nada de romantizar épocas e acontecimentos. Sem amores eternos, com vincos profundos na pele, na praia de biquíni com gorduras sobrando, com o corpo que às vezes dá pane, mas com muita alegria. Brindemos.